VERA MATIAS

Vera Matias (Amarante, 1994) lives and works in Porto. Her practice always begins with drawing and is characterized by a strong connection between the material and the act of painting. The paint dictates the form, and a spontaneous process emerges with rules redefined with each mark. It is an evolving process that navigates through the multiple layers, applied, undone, damaged, and ultimately recovered. It all starts from a reaction to the world, into which the artist projects herself and which becomes an excuse to paint.


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There was a point at which theory transitioned into practice. How did this transition happen and how did the two converge in your work? I pursued my academic journey in the opposite direction. I began studying Scenography at college, which is a very hands-on field. At that time, I missed having the opportunity to write, read, and reflect, as it was very urgent to produce. When I finished my degree, I did a master's degree in Art Theory and Criticism, exclusively theoretical. I truly enjoyed those years, but I missed getting my hands dirty. It was at that time that I started painting more seriously. When I graduated from college in 2018, I continued painting and have not stopped since. Theoretical thinking and reading accompanied this practice. So I would say that it wasn't necessarily a transition but rather a series of searches and trial and error that led me here. The paintings probably wouldn't exist without these two bases, which end up complementing and blurring each other. I'm not sure how to answer the question of whether the chicken or the egg comes first.

How would you describe your work process? First of all, it is very exciting. The rules are my own and they are not always the same. I believe my paintings are a reaction to the world: to a sensation, an event, an object, a reading, a person, or a conversation. They come from pain, joy, and all the gray areas in between. We often project our experiences onto things, using them as excuses to paint. In contrast, my work emphasizes the connection between the material and paint. I began with acrylics, then discovered oils, sparking my true obsession with painting. Sometimes I start with an idea, other times just a shape or a stain. And I go with the painting, adding and subtracting, doing and undoing. And things happen that I hate. I "ruin" things that I love and can't get back. It's a frustrating and crazy process, full of errors. Eventually, it ends up working. Sometimes I take forever on a painting. Other times it's too fast. Oh, and drawing. Drawing is fundamental for me. Maybe I would say that my process is being in the world and painting. I think that's it.

How do the narrative and characters emerge are worked on in your paintings?  I feel the need to explore figuration in my work. This doesn't mean that I plan to create recognizable images, but I begin with something specific and retain certain qualities of that reference. This challenges me and enables me to express a thought through painting. Often, a painting just comes from something that caught my eye and gets transformed into the making. The characters appear first, and the narrative comes later. The distance allows me to see the story I wanted to tell but didn't know how.

What work of yours would you choose to define you at this moment? I recently painted using a completely different method than my usual approach. I spread the canvas on the floor, printed my feet dozens of times, and then walked up there for a long time, from one side to the other. I did this using oil paint and it took me longer to clean the feet and floor than it did to paint. This occurred after the March 10 elections, and I named it "Against each other"

Finally, what are you currently working on? What can we expect soon? Every day in paintings! Furthermore, at the end of this year, I will participate in an artistic residency for three months. I have spent some time preparing for that. Before that, I will have two paintings at the Cerveira Biennial, which opens in July and runs until the end of the year. For August, I am preparing a solo exhibition that will take place at Térmita, in Porto.

PT

Vera Matias (Amarante, 1994) vive e trabalha no Porto. A sua prática parte sempre do desenho e é caracterizada por um vínculo muito forte entre a matéria e o acto de pintar. A tinta comanda a forma e, de um modo muito espontâneo surge um processo com regras que vão sendo redefinidas a cada mancha. É um processo errante, que deambula pelas várias camadas aplicadas, desfeitas, estragadas, recuperadas. Tudo parte de uma reação ao mundo, onde a artista se projeta e que se transforma em pretexto para pintar.


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No teu percurso deu-se uma transição da teoria para a prática. Como foi esta passagem e de forma se conciliaram as duas no teu trabalho? O meu percurso académico realizou-se no sentido inverso: comecei por estudar Cenografia na faculdade, uma área bastante prática. Nessa altura sentia falta da escrita, da leitura, de tempo para reflexão: era muito urgente produzir. Quando terminei a licenciatura, fiz um mestrado em Teoria e Crítica de Arte, exclusivamente teórico. Usufrui muito desses anos, mas senti falta de meter as mãos na massa. Foi nessa altura que comecei a pintar mais seriamente. Quando terminei a faculdade, em 2018, continuei a pintar e não parei até hoje. O pensamento teórico e a leitura foram acompanhando essa prática. Por isso diria que não se tratou necessariamente de uma transição, mas de uma espécie de círculo de procuras e tentativa-erro que acabou por me trazer até aqui. Provavelmente as pinturas não existiriam sem essas duas bases que acabam por se complementar e esbater. Se vem primeiro o ovo ou a galinha, não sei responder.

Como caracterizas o teu processo de trabalho? Antes de tudo, é muito excitante. São as minhas próprias regras e nem sempre são as mesmas. Por um lado, sinto que as pinturas vêm de uma reação ao mundo: a uma sensação, um acontecimento, um objeto, uma leitura, uma pessoa, uma conversa, uma dor, uma alegria, ou das linhas cinzentas que existem no meio disso tudo. Acho que acabas por projetar sempre o teu contexto e tudo se torna pretexto para pintar. Por outro lado, há no meu trabalho uma relação muito necessária com o material, com a tinta. Eu comecei por pintar com acrílicos e depois encontrei os óleos e veio daí a minha verdadeira obsessão com a pintura. Às vezes começo com uma ideia, outras vezes só com uma forma ou uma mancha. E vou indo com a pintura, adicionas e tiras, fazes e desfazes. E acontecem coisas que eu odeio, “estrago” coisas que adoro e que não consigo recuperar. É um processo frustrante e doido, cheio de erros. Eventualmente acaba por funcionar. Às vezes demoro uma eternidade numa pintura, outras vezes é demasiado rápido. Ah, e o desenho. O desenho é fundamental para mim. Se calhar, eu diria que o meu processo é estar no mundo e pintar. Acho que é isso.

De que forma surge e é trabalhada a narrativa e a personagem/figura nas tuas pinturas?  Sinto necessidade de explorar a figuração no meu trabalho. Isto não significa que pretenda produzir imagens reconhecíveis, mas parto de qualquer coisa concreta e mantenho determinadas qualidades dessa referência. Isso desafia-me e permite-me produzir um pensamento na pintura. Muitas vezes, uma pintura vem apenas de alguma coisa que me captou o olhar e vai-se transformando no fazer. As personagens vão aparecendo e a narrativa vem depois. O distanciamento traz essa história que eu já queria contar e não sabia.

Que obra tua escolherias para te definir neste momento? Recentemente fiz uma pintura completamente diferente das que faço habitualmente, no que diz respeito ao método. Estendi a tela no chão e imprimi os meus pés dezenas de vezes, andei ali em cima um bom bocado, de um lado para o outro. Fiz isso com tinta a óleo e demorei mais tempo a limpar os pés e o chão do que a pintar. Isto foi depois das eleições de 10 de março e chamei-lhe “Uns contra os outros”.

Por último, em que estás a trabalhar atualmente e o que podemos esperar para breve? Nas pinturas, todos os dias! Para além disso, no final deste ano vou participar numa residência artística durante três meses e tenho passado algum tempo a preparar isso. Antes disso, vou ter duas pinturas na Bienal de Cerveira que inaugura em julho e fica até ao final do ano. Para agosto, estou a preparar uma exposição individual que terá lugar na Térmita, no Porto.

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